Você já se apaixonou? Já sentiu aquele formigamento no estômago, uma ansiedade contumaz para estar com o outro, alvo dessa paixão? E se eu te disser que você criou essa imagem do amor ideal e que essa imagem não é verdadeira? Que ela existe apenas em sua mente?
Quando nos apaixonamos fazemos isso. E fazemos isso porque é uma maneira de controlarmos esse amor, de adestrarmos esse sentimento. Projetamos algo que não existe da forma que gostaríamos que ele realmente fosse. Atribuímos então qualidades e virtudes a esse ser amado que jamais são a tradução da realidade. Tudo conspira para isso. A química em nossa corrente sanguinea, o tesão, o novo, há tanto para trocar...
Mas o tempo passa e vamos aos poucos percebendo que é preciso nos relacionar com uma versão menos ilusória do totem que construímos. As questões fisiológicas aparecem, a paciência é testada, as discussões mais bobas encontram espaço, a rotina parece jogar contra, a atração diminui, a relação se transforma em outra relação. Não necessariamente pior. Apenas diferente. E, via de regra, profundamente mais real. Nem sempre é o que queremos, não? A ilusão atrai e nós a havíamos moldado do jeitinho que queríamos.
O tempo causa rupturas no barro daquele boneco perfeito que criamos quando há um amor jovem. Pessoalmente nunca gostei dos primeiros meses tão idolatrados. Tudo é muito intenso, muito fantasioso, muito cansativo. Mas isso sou eu. Uma alma velha desde muito jovem.
Em minha cabeça sempre ponderei, mesmo com pouca idade, sobre a real condição humana da solidão como algo intrínseco e inelutável. Chegamos sozinhos e iremos sozinhos. No meio do caminho fazemos tudo por encontros que abrandem ou nos façam esquecer o inevitável, a finitude, a velhice coxa e imparável. Estamos todos condenados a morte mesmo não sendo culpados e nem inocentes. Essa é uma questão importante da filosofia e uma pílula difícil de engolir. Se ainda assim a vida vale a pena ser vivida mesmo com um relógio a contar nossas horas.
A projeção distorcida do outro, seja para o bem, por vezes para o mal, é uma forma de lidarmos com as asperezas da vida e da existência. De nos protegermos, de encontrarmos um lugar seguro pois em nosso subconsciente sabemos que tal lugar não existe.
Assim, a fim de conseguirmos carregar o fardo pesado da vida, procuramos outros seres para dividir o peso. Os emprestamos características segundo nosso desejo e aspirações. Elas só são reais em nossas mentes, pois são NOSSAS quimeras. Apenas nossas. Quando a miragem se esvai, condão da vida, culpamos a projeção e raramente a nós. A dor seria demasiada grande e culpa é a maior desgraça entre todas as desgraças.
E vamos assim, desejando o que não temos, pois quando temos não mais desejamos, tornando a felicidade uma improbabilidade, ao passo em que caminhamos pela estrada do tempo, desengoçados como mulambos perdidos, equilibrando malabares, sendo palhaços e trapezistas em um teatro mambembe chamado VIDA.
Comments