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Foto do escritorHP Charles

A verbalização do afeto.

Qual foi a última vez em que você disse que amava seu parceiro? E qual foi a última vez que você disse isso de forma que ele sentisse que isso realmente significava algo? Sem obrigações embutidas, sem interesses ocultos, sem automatizações decorrentes do tempo ou deveres oriundos do enlace?


Tenho escutado de algumas pessoas a falta que sentem de ouvir um simples "eu te amo" por parte de seus parceiros. A declaração de quão importantes são. De quão relevante é a sua presença na vida do outro. Há uma certa tragédia nisso, não? Em não se sentir amado ou acolhido em sua relação. Sim, a verdade é que o que importa de fato é o que se faz pelo outro e não o que se diz, porque palavras são levadas pelo vento e qualquer um é capaz de dizer qualquer coisa, de mentir. Mas se você já ouviu um "eu te amo" sincero, sabe a força que tais palavras possuem.


Imagino que atualmente, com conexões tão rasas, cada vez mais numerosas e insignificantes, talvez esse importante momento dentro de uma união tenha perdido valor, e seu peso foi minorado. Mas não deveria.


A verbalização é fundamental em nossa psicologia. Falar importa. Ser capaz de expressar o que se sente ou se deseja, importa. Inclusive no sexo. Se sentir livre no ato sexual para se dizer o que está se sentindo, dar azo a seu inconsciente, suas fantasias e expressá-las inclusive verbalmente, torna tudo mais excitante, mais intenso. A transa calada sempre me pareceu pior, talvez até insuficiente, pois se há intimidade, ela precisa ser comungada, dividida. E falar é se abrir, e se abrir é íntimo. Mais íntimo do que o próprio sexo em si. Não há intimidade com uma puta, há? Não, há apenas o sexo.


Existem pessoas que possuem uma gigantesca dificuldade em dizer o que sentem. Reclamar não é necessariamente fazer isso. Se abrir é se tornar vulnerável, e para isso é preciso coragem e ENTREGA. É passar por cima em nome de algo maior, de receios e medos. Quando se ama existem conversas difíceis. Relações relevantes impedem diálogos dolorosos, arriscados. Qualquer coisa é melhor do que o silêncio. Mas sim, o silêncio tem um enorme peso e também pode significar um milhão de coisas.


Pessoalmente, em minhas relações, existem momentos onde fico mais calado, às vezes por dias, e isso normalmente nada tem a ver com com minha parceira. Tem a ver comigo resolvendo internamente meus problemas. Mas entendo o quanto isso pode ser incômodo para o outro.


Muitos usam o silêncio como punição em uma relação. Mas nesse caso isso é uma espécie da manipulação e não uma necessidade de reflexão. Ao menor sinal de contrariedade a pessoa aplica um "tratamento de silêncio" no outro a fim de machucá-lo, fazê-lo se sentir culpado, puni-lo. E aí não é espaço, é covardia. Não é meditação, é tortura. Apenas covardes e tolos fazem isso. Não é sinal de amor, mas sim de doença, de transtorno.


Existem diversas formas de expressar amor. Grande parte dos homens, eu incluso, costuma demonstrar afeto através da proteção, de cuidar de coisas que precisam ser cuidadas para sua mulher. Em tentar, da maneira possível, tornar a vida dela mais confortável e agradável. Mulheres, em geral, mostram seu afeto através do respeito e com pequenos agrados cotidianos. O mero entregar de uma cerveja durante o jogo é um sinal que será interpretado como amor por um homem saudável emocionalmente.


Mas tudo isso não exclui o falar. Percebo que hodiernamente perguntar genuinamente sobre o estado de uma pessoa é cada vez mais raro, e por isso, cada vez mais importante. Faz pouco tempo em que falei com um grande amigo a quem não via há muitos anos. A conversa se aprofundou e em determinado momento, sentindo sua fragilidade ao me contar acerca de sua situação afetiva, perguntei: "como você está se sentindo?"


A resposta veio através de um choro compulsivo. E ele me respondeu..."você sabe há quanto tempo não me perguntam isso?"


Parem para pensar um pouco sobre o quão solitário ele estava em sua vida, mesmo sendo casado e com filhos. Pensem em quanto ele precisava ouvir que alguém se importava com ele e não apenas o quanto ele podia prover. Os tempos atuais estão destruindo pessoas porque a internet e os valores as fazem acreditar que o que importa é ter e parecer ao invés de ser, mas nada substitui o afeto. NADA.


Alguns anos de psicanálise me fizeram acordar para isso, para o fato que eu precisava DIZER. Sim, a verbalização não significa necessariamente a verdade, sabemos, mas o que se diz tem muita importância quando sai da boca de pessoas de valor, e aí seu peso é monumental. E tal peso não é traduzido pela quantidade de vezes em que se diz algo relevante, mas pela maneira, pela condição em que se diz.


Acredito muito na força das palavras proferidas genuinamente, de coração e alma. Elas podem mudar tudo. Podem te fazer sonhar, podem curar, podem redimir. Tem tanto poder que, usadas para o mal, podem fazer o oposto. Adoecer, destruir, matar.


Hoje você já disse que ama alguém? Seus pais, seus filhos, seus parceiros? Será que isso faria diferença na vida deles? Acredito que sim. Há afeto e um poder imenso nas palavras, que atiradas, jamais voltarão. Por isso é preciso também responsabilidade. Expressem verbalmente seus amores, digam o que sentem, falem ao outro a importância que tem em sua vida. Entendam que o não dito apodrece dentro de nós e rouba nossas almas e nossa alegria. "Eu te amo". Viu como é simples?


"No princípio era o Verbo"

(João 1:1-4)



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