Clube da Luta é uma adaptação baseada no magistral livro de Chuck Palahniuk e que rende uma espécie de “homenagem” à filosofia de Nietzsche. Basicamente a película é uma abordagem aos medos e angústias existenciais presentes no mundo moderno através da visão niilista e do conceito de “super-homem” criado pelo filósofo, bem como a exposição de como os valores modernos tem afetado a identidade das pessoas através do consumismo, muitas vezes a desintegrando e a reconstruindo de forma enviesada e pérfida.
No filme, Edward Norton, o protagonista, é um sujeito desiludido, em constante batalha com o abismo criado pelo vazio da cultura do “ter”, do capitalismo de consumo, das “coisas que possuem pessoas”. Ele se debate, se ressente e se destrói internamente com a esterilidade de valores improfícuos, cíclicos e insaciáveis, que demandam sucesso superficial e rasteiro e compras incessantes e inalienáveis. E basicamente é essa a crítica que está em conluio com a filosofia de Nietzsche e seu conceito de niilismo, ou seja, de que os valores tradicionais não encontram base ou sentido.
A crase sanguínea da narrativa de Clube da Luta é justamente o conceito de Übermensch, ou “Super-Homem”, representado na ausência de vínculo ou afetação com as leis que refream e castram, com a superação de valores morais históricos, imposta por uma sociedade hipócrita e decadente. Nesse sentido, assim como o filosófo propõe, o filme aduz a um renascimento do protagonista. A morte para um renascer das cinzas, novo, forte, destemido, não mais acorrentado a um rebanho adoecido, altamente neurótico e depressivo.
Assim, em sua jornada, o anti-herói passa a rejeitar as normas sociais, abraçando instintos primários, primitivos, e se oblitera. O protagonista se autodestrói para se autocriar, mas dessa vez transcendente, irrefreável, destemido, ouvindo as vozes e apelos filosóficos de Nietzsche, e assim redefinindo sua existência.
O ponto de guinada do filme ocorre justamente quando ele percebe que Tyler Durden é uma manifestação da própria personalidade, que se dividiu. Fica claro então aí o conceito nietzscheano de “Vontade de Poder”. Assim, seu “alter-ego” o impulsiona a se emponderar e dar azo à sua individualidade, superando os conflitos em seu âmago. Ele enfim consegue dormir.
O real esforço, a batalha proposta e vivida entre o protagonista e Tyler, é a luta interna entre o desejo de um “renascer” potente e autêntico e a conformidade. O filme também espelha a ideia de Nietzsche do “eterno retorno”, ou seja, de que a vida é uma eterna repetição e que sempre ocorrerá da mesma forma. Nesse sentido, a narrativa inserida no filme com a destruição da sociedade de consumo encapsula esse conceito.
Quando o protagonista enfrenta seus temores, rechaça seus medos e assume seus desejos mais profundos, renasce metaforicamente, acolhendo a premissa do filósofo acerca do Eterno Retorno como uma maneira de concretizar uma transformação pessoal.
A narrativa fundamental de Clube da Luta possui cristalino paralelo com a crítica de Nietzsche para com a rejeição de valores de uma sociedade fria, vazia, onde pouco mais existe além do consumo alienado, do materialismo mais vil e perverso, e da falta de sentido para seguir em frente. Nesse condão, a proposta é do caos como chave, como uma saída viável para a reavalição de valores claudicantes e a criação enfim, de um novo e redentor “sentido” existencial.
Clube da Luta é, em essência, uma viagem cinematográfica à filosofia Nietzscheana, e o percurso é cuspido na cara da sociedade moderna através dos conceitos do “Overman” e do Eterno Retorno. O desespero, a insônia, o vazio, a busca pela completude em um mundo difuso, dividido, fragmentado que atinge às pessoas, desintegrando suas individualidades.
Em Clube da Luta o caos e a porrada são as alternativas existenciais e terapêuticas oferecidas por Nietzsche. Algo supostamente mais digno e saudável do que “as tetas” de Meat Loaf, ou de grupos de pacientes terminais ou então móveis da IKEA.
E então? Com você tem dormido?
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