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Foto do escritorHP Charles

O medo da intimidade.

Em primeiro lugar é preciso entender que nem sempre o sexo gera intimidade. A profissão mais antiga da história comprova isso. Na prostituição há um erro fundamental de compreensão quando se acredita que se paga pelo sexo. Não. O pagamento é para que a pessoa vá embora. E isso ocorre porque o que se deseja é meramente a conexão física e jamais a emocional.


Nas relações modernas, com o rodízio sexual facilitado por aplicativos, pelas redes sociais, pela cultura do desapego e pela relativização da infidelidade, se multiplicam os "one night stand", o sexo descompromissado, as relações fisiológicas com o mínimo de pessoalidade possível. E é assim porque qualquer vestígio de intimidade implica em algo que é assustador para muitos em tempos de ilusão e fantasia. Ser visto como realmente é.


Ser visto sem a máscara, significa, acima de tudo, a possibilidade de se questionar a si mesmo. De olhar no espelho, de ter que se fragilizar, de entregar segredos e se tornar, de alguma forma, vulnerável. "Se você souber quem sou vai correr em direção oposta, porque sou uma pessoa machucada, porque minhas bagagens são muito pesadas e por isso impossível de ser amado?"


Vestido com meu disfarce, sob o manto de minha capa de invulnerabilidade, posso ser quem quiser, não? Me torno possível, apropriado, desejável. Mas ao abdicar do anônimato emocional fico nu perante o outro. Desprotegido. E isso é terrível. É dizer abertamente: "eu sou assim, na realidade".


Em uma sociedade plastificada, líquida, que venera a miragem e abomina a verdade, a intimidade é um preço que poucos aceitam pagar. É muito mais fácil enviar um "nude" do que admitir uma infâmia, mentira ou covardia. A exposição física, por vezes, encontra até mérito ou lucro, mas a emocional, jamais.


Muitos carregam o peso de acreditar genuinamente que se forem realmente conhecidos, decifrados, serão desprezados. O maior temor é ser visto como repulsivo. Mas o que não percebem é que é justamente essa a definição de intimidade. A intimidade não está no sexo, mas no banho dividido após o sexo. Está no dia de merda confessado, no choro oriundo das perdas e dos medos. A intimidade é o condão da entrega real e das relações autênticas e profundas.


Sim, é possível se relacionar sem intimidade. Os tempos atuais tem provado isso de forma pródiga. Mas é isso que se quer? As relações rasas, o cada um por si e foda-se, o fim de tudo com um lenço de papel que limpa o gozo? Não percebem que o corolário funesto de tudo isso é a solidão existencial, a fuga para a ilha habitada apenas pelo coqueiro virtual que não produz sombra, apenas arrependimento?


Enquanto muitos temem a intimidade, confesso que a abraço sempre que vislumbro humanidade e afeto. Já perdi muito por isso, mas já ganhei muito também. A colheita é de dor mas também de sorrisos. E isso se chama viver. Não me interessam as conexões robóticas, frias, lacônicas, onde a fleuma reina sobre o sanguíneo. Quero sentir e fazer sentir. No final das contas, nos momentos mais relevantes de nossas vidas, nas perdas quase intransponíveis e nas derrotas mais acachapantes, não dá para fingir. E é justamente aí que nos mostramos e saberemos quem sentará à mesa conosco. Atados pelo que temos de melhor e de pior. Inteiros, enfim.

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