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Relacionamentos tóxicos.

Atualizado: 27 de fev. de 2024

Em um assunto tão sério quanto esse, é melhor começar tirando o elefante da sala. E o elefante é: muito provavelmente em uma relação permeada pela dor e repleta de sofrimento, havia uma atração ou desejo, mesmo que inconsciente, por tais sentimentos. Era preciso dois para o circuito se fechar. Um pacto foi consignado. Passo a descortinar.


Não há dúvida que alguém que sofreu um trauma deseja ser amado genuína e completamente. Mas e se essa pessoa não souber exatamente o que é o amor? E se em sua vida ela foi tão pouco acostumada com esse sentiment que quando realmente o recebe passa a rejeitá-lo porque julga não merecê-lo ou porque desconfia de sua veracidade? O que acontece, então? Ela pune e despreza esse amor. Ela o testa incansavelmente e muitas vezes o esgota.


Imagine agora o contrário. Imagine que essa pessoa que não tem nenhuma real consciência do que é o amor porque jamais o experimentou de fato, ou porque é uma pessoa traumatizada e quebrada, encontra alguém que a trata mal? Que é abusivo, tóxico e manipulador. Que é negligente na atenção concedida, que a sufoca e oprime, que a controla, que é indvidualista em sua visão de mundo, que é narcisista e um foco de negatividade e ressentimento em seu cotidiano. Isso não seria mais FAMILIAR e, portanto, mais atraente para ela? Claro que sim, porque a vida inteira ela lidou com esse tipo de emoção e é evidente que é mais fácil entregar seu coração a quem a fez experimentar sentimentos com os quais ela se acostumou e reconhece. Percebem o truque? Percebem porque tantos acabam envoltos em uma teia de tormentos e dissabores?


Se alguém repetidamente oferece carinho a quem nunca o recebeu, cuidado a quem jamais o teve, a reação natural é a desconfiança e até a rejeição. Então a reação costuma ser: "vou brigar com você, vou gritar com você, vou ser mal educado, grosseiro, vou dizer 1000 vezes que você nada vale e outras 1000 vezes afirmar que terminarei com você. Vou retornar para o que eu conheço, pois me sinto seguro no calor do inferno". Por ter ouvido isso tantas vezes, o abusado muitas vezes rejeita o real afeto, e reproduz o comportamento do abusador em outra relação. Ele sente falta do abuso e do abusador porque confunde afeto com dor. E ESCOLHE se recordar dos momentos bons e do início repleto de sedução e investimento. A confusão na mente do abusado é incessante.


A atração é ao turbilhão, é à tempestade. Existem pessoas que por algum dano em sua psicologia, se viciam nas constantes enormes variações emocionais perpetradas em uma relacão tóxica, e a paz e o afeto cotidiano parece extremamente entediante para elas. Não raro abdicam de relações saudáveis e produtivas porque se sentem "acolhidas" ao reproduzir as sensações intensas e os estratagemas vividos em estímulos negativos e destrutivos. É como uma droga. Como um hábito que aos poucos consome o corpo e a alma. Assim, um padrão é consignado e abusado e abusador se conectam e se pertencem em um vínculo doentio. As consequências normalmente são imprevisíveis e até trágicas.


Isso tudo parece horrível, não? E é. Porém é assim que o narcisista encontra terreno e semeia um relacionamento vil que lhe ofereça validação o tempo inteiro. Ele maltrata, vez que sua baixa autoestima o conduz irremediavelmente a isso. Somente acreditando que é superior ao parceiro, e não igual, ele consegue algum alento em sua moléstia. E então ele negligencia, consome, despreza, mas quem sofre as consequências é incapaz de distinguir o amor do abuso, vez que pesar é tudo o que sempre conheceu. E aí passa acreditar que a culpa é sua e que realmente é uma porcaria. E acredita que deve amar os monstros exatamente do jeito que são, vez que não vale nada. "É um favor ele ficar comigo".


Muitas e muitas vezes, com o término da relação, o abusado se sente perdido porque o referencial jamais foi ele e sim o outro. A identidade em que vivia, não era a própria, mas a de um parasita emocional. A relação era baseada não na própria realidade, e por isso referendava a conduta e pensamentos alheios, se submetia porque acreditava que era inferior. Esse é o jogo. E o amor jamais esteve ali. O que sempre houve foi dependência e fantasia mórbida.


Compreendem o ardil? Compreendem por que por vezes é tão difícil romper um padrão e, por conseguinte a relação, mesmo que ela tenha sido terrível? Porque a doença é bilateral. Um deseja abusar e o outro deseja ser abusado vez que não conhece outra realidade.


Se ser mal tratada é tudo o que você teve, você vai se apegar a isso, já que julga ser a única experiência possível. Se existe uma brecha existencial em você que te deixou uma cicatriz - que pode ter ocorrido até décadas atrás - e o mau caráter percebe essa rachadura, ele vai usá-la contra você. Ponto. Essa é a sua natureza e seu alimento.


Muitas vezes anos se passam até que a pessoa abusada perceba a realidade em que se meteu. O turbilhão de emoções despertado em um relacionamento assim é enorme, vez que a carência e os traumas são estimulados e revividos com muita frequência. Normalmente há um jogo de "quente e frio" que intensifica a relação, prevenindo que o abusado consiga despertar do abuso. Há um condicionamento psicológico que transforma o desprazer em um prazer mórbido que acompanhará o relacionamento.


Eu entendo que para alguns será duro ler esse pequeno texto, mas quem sabe também ele gerará identificação e poderá ser útil de alguma forma. Portanto, se você viveu ou vive algo parecido com o descrito, tente não se culpar. Você apenas não identificou o golpe. E não identificou porque jamais conheceu o amor verdadeiro, e se o conheceu, talvez não o tenha percebido e abraçado por estar tão machucada, por não estar acostumada com ele. Se dor é só o que teve, após algum tempo, é só dor o que desejará, pois não saberá a diferença entre o que é dor e o que não é. É preciso romper o círculo.


"Por que alguém me amaria? Certamente há algo de errado com ele. Me deixe retornar à pessoa que me fere, pelo menos com ele eu sinto algo. Pelo menos aqui eu vivo com intensidade as coisas que conheço". Sim, para quem se julga morta, mesmo um tapa pode a fazer se sentir viva. E qualquer coisa é melhor do que estar morta, não? Do que não sentir nada. Até o sofrimento.


Não tenha medo. Se liberte. Se redima. Não se assuste se coisas verdadeiramente boas começarem a acontecer em sua vida. As reconheça e abrace, finalmente. Não se satisfaça com migalhas afetivas. Comece uma nova história. Você merece. Repito...você merece.

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