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Foto do escritorHP Charles

Retorno ao cristianismo?

Esse é um texto que jamais imaginei que escreveria e devo ser muito cuidadoso e preciso em minhas palavras. Faz poucos meses tenho sentido uma espécie de inclinação moderada em rever minhas convicções religiosas ou "não religiosas", para ser mais claro.


Tal "sensação" evidentemente tem me gerado uma enorme reflexão, mas incrivelmente, nenhuma angústia. Cumpre lembrar que redigi dezenas de textos e produzi dezenas de vídeos onde argumentei fortemente a favor do ateísmo. Boa parte deles ainda se encontra no Youtube, "reupados" por pessoas que admiravam meu trabalho no "Conexão Ateísmo".


Durante anos "militei" a favor da libertação da religião e contra o dogmatismo religioso. No entanto, ao longo dos últimos 3 ou 4 anos, tenho revisto minhas abordagens e pensamentos anteriores. O que de fato ocorre, é que se ainda não estou convencido do milagre da fé e da ressurreição de Cristo, me convenço a cada dia que passa, da força e da necessidade dessas crenças como um dos pilares de nossa sociedade. É um processo.


É como se o fiel balança estivesse se movendo de forma imprevisível para mim. É óbvio que sei o peso disso por todo o trabalho que fiz no sentido oposto, e que me trouxe uma série de consequências. Algumas boas e outras ruins. Hoje tenho muitas perguntas e poucas respostas. A maior delas diz respeito ao que estou sentindo e como isso se contrapõe à minha racionalidade. Podemos chamar isso de "renascimento"? Um termo com forte potência religiosa. Não sei honestamente dizer.


Eu não penso mais na corrupção que existe na Igreja Católica, em seu poder institucional, não penso nos pastores charlatões que abundam os templos evangélicos, não me relaciono com religiosos de ocasião, cuja fé é apenas um disfarce de virtude onde abrigam mau caratismo, ganância e inveja. Sim, conheci muitos desses tipos e não é isso que me interessa.


Aos 15 anos me tornei ateu, e isso ocorreu em um ambiente onde estava cercado de religião. Estudava no Colégio de São Bento e lidar com monges, mosteiros e aulas de religião era parte do cotidiano. Todos os alunos assinavam um termo de compromisso com aquela direção religiosa. Iam à missas, se confessavam, até crismado eu fui.


Décadas depois, me vejo revendo essa posição. E a revejo filosoficamente, porque acredito que é o campo correto para abordá-la e não a ciência. Sim, esse reposicionamento que ainda não tem direção precisa, parece um novo parto. Tento deixar ao máximo minhas emoções fora do caminho, porque ainda não há espaço para elas nesse processo.


Atualmente minhas ilações encontram arrimo no campo da "intuição", uma palavra que sempre evitei usar. Há uma espécie de compulsão que me empurra a rever o que acreditava ou não. Seria isso tudo fruto do que passei há alguns meses? Perdas inerentes à vida? Mas passei por outras grandes perdas antes. O que há de diferente?


Sinto uma enorme propensão à caridade e ao abrigo em mim. Sempre fui uma pessoa empática, apesar de crítico. As mazelas do mundo sempre me afetaram, mas há algo diferente e não sei bem explicar o quê. Sei que é puro, sei que é benigno, sei que é útil. Será que ao nos aproximarmos do mal, ocorre uma espécie de "chamado", de vislumbre, de reconexão?


Não tenho todas as respostas e desconfiaria de quem diz que tem. Minha mãe foi católica quase a vida inteira, se entregando devotamente ao espiritismo algumas décadas antes de sua morte. Sempre se manteve firme em seus rituais e abluções kardecistas e eu olhava aquilo com estranheza e alguma arrogância decorrente de tanta leitura sobre religião. Hoje percebo minha tolice e infantilidade. As certezas acadêmicas são como um castelo de areia que se desmonta frente à primeira marola. A dúvida é nossa real amiga.


Por atos da vida e do "destino" ganhei um escapulário de uma pessoa que se tornou absolutamente relevante em minha vida em um desses encontros inesperados, improváveis e mágicos que acontecem poucas vezes em nossa existência. Sim, usarei esse artefato religioso e significativo com absoluta regularidade e orgulho, acreditando em sua proteção. Dislate? Superstição? Crendice? Quem pode saber ao certo? O que importa de verdade é o que tal objeto pode significar para mim, e todo o resto é palpite.


Ano passado eu consertei e recuperei a caneta Parker 51 de meu pai não pelo valor, mas pela enorme representatividade que teve em sua vida e por isso tem na minha. Tal caneta atualmente está retida por portadores ilegítimos, por pura malignidade, vez que não tem significado nenhum para eles. Mas isso também me ensinou uma enorme lição. O desprendimento, mesmo de coisas que me são tão importantes. Nada roubará as memórias de meu pai e sua indissociável caneta. Tal sabedoria me trouxe paz e blindagem, mas acima de tudo, me fez refletir sobre o que não posso controlar. Sobre como posso ser melhor, mais consciente, mais útil em minha vida e na vida de terceiros. De onde tem surgido esses sentimentos? Da minha biologia? De meu caráter? Seria esse o efeito das perdas que tive, dos problemas e injustiças para onde fui catapultado? Não sei. Sinceramente, não sei.


O que sei é que tenho me tornado cada vez mais flexível em minhas convicções sobre meu ateísmo e acredito que esteja trilhando um caminho diferente e que não sei em qual lugar vai parar. Retornarei às minhas antigas convicções materialistas ou me voltarei novamente ao transcendente?


Sim, confesso que por uma gama de motivos tenho pensado no catolicismo e em meus laços com a religião em minha adolescência. Ainda não vejo verdades, não assumo lados, não me prostro diante da cruz.


Mas talvez, apenas ao carregar a sua própria cruz, você possa então sentir a dos outros e a de Cristo. Quem sabe realmente sentir as dores e os espinhos sejam o único caminho para o "religare", para que a estrada nos seja mostrada. Uma luz perene e sacrosanta que tenha ficado coberta aos olhos de quem acreditava que tudo deveria ser visto pelo prisma dos homens e do mundano, mas jamais do divino.


Eu não tenho mais certezas. É um começo.



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2 комментария


Gilmar Bernardo
Gilmar Bernardo
20 дек. 2023 г.

Rapaz, quando vi seu texto nos stories do Facebook, não esperava uma confissão dessa magnitude. Sem querer chover no molhado: a gente acaba crescendo. De minha parte, confesso que tive os meus momentos de dúvida e por muitas vezes flertei com o pensamento materialista. Chesterton foi um dos nomes que me ajudaram a reordenar as coisas. Passei à leitura dos Evangelhos e, verdade seja dita: não importa quantas vezes eu os leia, sempre me espantarei com a figura de Cristo (mesmo os ateus mais ferrenhos costumam admirá-lo). Um amigo recomendou-me rezar o Terço, ainda não o fiz, pois acabo de sair do protestantismo, de modo que a Igreja Católica ainda me é estranha, apesar de me sentir melhor à sua…

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HP Charles
HP Charles
20 дек. 2023 г.
Ответ пользователю

Sim, parece que a coisa carrega um peso maior quando vc meio que “trabalhou” para o outro lado. Vamos ver…é um caminho que estou percorrendo.

Лайк
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