Muitas vezes ficamos maravilhados com a discrepância entre a vida privada e pública dos nossos ídolos: celebridades, estadistas, estrelas, escritores e outras figuras talentosas. É como se tivessem duas personalidades, dois “eus”: o “verdadeiro” que reservam para os seus entes mais próximos e queridos e o “falso” que inventaram e que exibem em público.
Em contraste, o narcisista não tem vida privada, nem verdadeiro eu, nem domínio reservado exclusivamente aos mais próximos e queridos. Sua vida é um espetáculo de livre acesso a todos, em constante exposição, conquistando suprimento narcísico de seu público. No teatro, que é a vida do narcisista, o ator é irrelevante. Só o show continua. O Falso Eu é tudo o que o narcisista gostaria de ser, mas, infelizmente, não pode: onipotente, onisciente, invulnerável, inexpugnável, brilhante, perfeito, em suma semelhante a um deus.
Seu papel mais importante é extrair dos outros suprimentos narcisistas: admiração, adulação, obediência e, em geral, atenção incessante. No modelo tripartido de Freud, o Falso Eu suplanta o Ego e se conforma ao inatingível, grandioso e fantástico Ideal do Ego do narcisista. O narcisista precisa, acima de tudo, SER VISTO.
Seu único interesse, não importa o tipo de relação, a história ou aparência da vítima, é suprimento. Não, narcisistas não possuem uma preferência por “empatas”, isso é um mito. Ele busca suprimento, sexo, serviços e segurança. 4 “esses”. Se a vítima oferecer dois desses itens, ele ficará interessado.
No entanto, existem dois tipos de pessoas que se sentem mais atraídos por narcisistas e frequentemente se envolvem com eles reiteradamente. O codependente e o borderline (em texto próprio explicarei porquê).
Outra afirmação que sempre é feita erroneamente é que todo narcisista trai. Sim, são muito mais propensos a traírem, mas existe um subtipo chamado “narcisista cerebral”, que demonstra pouco interesse por sexo (ao contrário do somático e grandioso), que pode passar anos sem sexo, em celibato.
Esclareço também que, ao contrário de 95% das postagens com que nos deparamos na internet onde se afirma que narcisistas fazem “gaslighting” e “future faking”, isso não é verdade. Narcisistas confabulam. Eles preenchem “lacunas” em sua memória com uma versão que proteja sua grandiosidade. Sim, narcisistas possuem lacunas em sua mente que os impede de reter determinadas memórias. Narcisistas ACREDITAM no que dizem, mesmo que durante pouco tempo. Se existe gaslighting, então se cuida de um psicopata.
Outro equívoco muito comum de ser lido por aí é que “todo psicopata é narcisista mas nem todo narcisista é psicopata”. Errado. O que ocorre é que ambos dividem “GRANDIOSIDADE”. Um mecanismo de defesa. Pode haver comorbidade entre os dois transtornos, ou um caso híbrido como o do narcisista maligno, no entanto.
Existem muitos mitos e muitas verdades sendo reveladas sobre narcisistas patológicos e isso é positivo em uma sociedade que é propícia para que se proliferem, que os glorifica ou relativiza sua crueldade. Em um mundo de individualistas, instrumentalistas, os narcisistas nadam de braçada. Há duas “vacinas” apenas até o momento. Informação e terapia. É conveniente usá-las.
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